quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

2º -CRÍTICA AO TEATRO FÚRIA E OS INSURRETOS DESGOVERNADOS



ENTRE TAPAS E CUSPES

Grupo de Cuiabá apresenta A Justiça do 0 X 0, no Solar do Barão.

O Retorno do homem contemporâneo a formas extraordinárias de estupidez, em vários níveis, do religioso ao político, é uma das preocupações do Teatro Fúria, criado em 1998, em Cuiabá, e um dos mais importantes grupos de Mato Grosso. Com Nepal e Apartamento 501, arrebatou prêmios em festivais nacionais, além de boas críticas. No Fringe, apresenta-se com Toma Lá Dá Cá – A Justiça do 0 X 0, no Solar do Barão, de Péricles Anarcos, ator e um dos fundadores do grupo.

A montagem tem um forte argumento: o embate entre a justiça – que mediatiza as ações do ser humano – e o imediatismo das vontades e desejos humanos, que, para além de qualquer psicanálise, continua acusando a besta que nos habita. Coerente, a dramaturgia sustenta-se sobre o pilar da contradição entre o racionalismo e o primitivismo, sob um registro alegórico: o Escritório Deliberativo Permanente, onde se delibera sobre queixas e crimes, aplicando-se a justiça em prol de um reequilíbrio do ato desestabilizador. Mas o sistema é ameaçado com a chegada de uma nova deliberadora.

Para “contar” essa história, o grupo se vale de um tipo de encenação surgido no início dos anos 60: sacudir a passividade da platéia gerando um sentimento de mal-estar decorrente de atos supostamente transgressores. Vale dizer que os atores, que gritam, cospem, correm e arremessam objetos sobre a platéia, optam por uma encenação datada, dissolvendo um ótimo argumento em excesso de descaramento e cinismo.

Claro que tal característica salienta a identidade de um grupo provocador e astuto (não passará invisível por Curitiba). Mas, a partir dele, podemos indagar: o cinismo é o caminho necessário da contemporaneidade? A provocação não surtiria mais efeito se o grupo se preocupasse mais com uma estética para o palco (afinal, há uma partitura sonora competente, atores corajosos, movimentos significativos e uma iluminação inteligente – branca-geral para a realidade e simbolista-vermelha para as aberrações do inconsciente)? Deliberemos....

Marici Salomão
Dramaturga e Jornalista

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